Wingene

José Eugênio

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Reflexões

Invisível ganância

A luz tênue do sol de chumbo esfria os corações. O calor dos motores não aquece os volantes que guiam possantes carros. Máquinas perseguidas por cães em busca de dourados ossos. Presos às invisíveis coleiras da servidão, vivem na ilusão de uma liberdade inexistente. Farejando as migalhas do poder, os caninos dentes guardam o portão dos seus senhores. A cada passo, sentem o peso de sua rotina escravizante, o estalo do chicote no ar. Mas a promessa de um osso maior é a única coisa que importa. No desbotado cinza do asfalto, queimam suas patas, vigiam as casas sob o jugo velado de seus donos. Alimentados pela mão invisível da ganância, julgam estar satisfeitos, desconhecendo as belezas do mundo fora das grades.

Mas, além dos muros altos e dos portões de ferro, a vida segue em um ritmo diferente. Pássaros, alheios à corrida insana, voam livres entre as nuvens. Eles não têm portões para guardar, nem ossos para disputar. Seus ninhos são feitos de gravetos e folhas, construídos nos galhos mais altos das árvores, longe do latido ensurdecedor e do olhar cruel. Cortam os céus, de um lado para o outro, sentindo o calor do sol e o frescor do vento. A cada voo, um novo horizonte se abre. A única riqueza que buscam é a vastidão azul. O ruído da corrida pelo metal dourado é apenas um eco distante, um latido que se perde no ar. No seu lugar, a melódica cantoria dos aninhados, inatingíveis pelo ódio daqueles que se contentam com as sobras.

(11/09/25)

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