Chronos
Cronos, o mais velho dos Titãs, movido pelo medo de ser usurpado, devorava cada filho recém-nascido. Num ato de pura voracidade, engolia não apenas corpos, mas futuros inteiros, condenando-os à escuridão silenciosa de seu ventre—um ciclo maldito onde o tempo não passava, apenas se repetia.
Enganado por Réia, sua esposa, cansada da carnificina, que nos panos luxuosos do sexto filho, envolve uma pedra. Cronos, sem suspeitar, engole a rocha—o peso da mentira desce por sua garganta, prenunciando a sua queda.
Zeus, o caçula não devorado, cresce longe do olhar paterno. Adulto e poderoso, domina o impiedoso Cronos, forçando-o a vomitar não somente a pedra, mas todos os irmãos aprisionados no tempo. Da escuridão emergem Hera, Poseidon, Hades, Deméter e Héstia—os bebês outrora sem futuro do ventre surgem crescidos, com a força de divindades plenas.
Com a queda do opressor, o tempo cíclico quebra-se. Em seu lugar, surge o tempo linear—irreversível, progressivo. As estações passam a seguir uma ordem verdadeira, e a natureza, antes estática, explode em ciclos de vida e morte que se renovam, não se repetem.
O antigo palco do eterno castigo cede espaço à verdadeira vida. O tempo universal, em sua essência, sorri satisfeito. A eternidade é evocada pela sinfonia do inesperado, notas que compõem a música das esferas em evolução sem fim.
Hoje, porém, muitos ainda vivem como se Cronos ainda governasse. Rolando a mesma pedra de Sísifo todos os dias: as mensagens que cortam o dia, a rotina que aprisiona a beleza, as metas que se sucedem. Esforço infindável alimentado por imperfeições eternas. Velejando sem destino, sem notar as belezas do acaso.
Mas Zeus permanece soberano. A música universal—a harmonia do cosmos—ainda quebra a monotonia. Ser ciente disso é libertar-se. É reconhecer que cada instante é único, um presente novo a viver. É escolher sentir o mundo como ele é: acíclico, linear—e por isso, precioso.
23/08/25 - 18:00